A decadência do regime-partidário é notória. O número de militantes partidários-inscritos é tão irrisório que retira, em abono da verdade, legitimidade aos líderes para falarem em nome dos seus partidos. O que se percebe é a existência de um conjunto de vasos comunicantes, entre as bases que anseiam por arranjar um encosto no aparelho do Estado e os dirigentes a jogarem as cartas de forma viciada em proveito próprio, ao ponto de olharmos para o país e verificarmos que nos conduziram para um precipício. A falta de regulação, por conveniência dos aparelhos dirigentes, faz com que se continuem a configurar cenários em que se atira para cima da crise internacional e de todos aqueles que pouco têm a ver com o estado de degradação para onde a Nação caminha, as culpas de uma situação criada por quem nos tem governado ao longo das últimas décadas.
Há culpados dos sintomas de que o país sofre. Desde o momento em que os governantes perceberam que podiam manipular a seu belo prazer os governados, até à nossa subserviência aos quesitos de uma Europa que dá com uma mão e tira com a outra, o povo português tem sido um joguete nos braços de uma classe política sem escrúpulos que tudo fez para engordar o aparelho do Estado com cerca de 14 mil organismos, muitos deles apenas e só para dar emprego aos correlegionários.
São 36 anos de aproveitamento da democracia por parte dos partidos políticos, que montaram um sistema eleitoral onde apenas se encaixam os seus rapazes, criando cidadãos de primeira e de segunda, protegendo-se nas reformas-pessoais que definiram na Assembleia da República e escamoteando tudo o que possa retirar privilégios a uma classe política analfabeta.
A responsabilidade da decadência de Portugal é de quem tem ocupado os lugares da governação. Ainda há uns senhores, que andam no arco-do-poder, que resolvem atirar poeira para os olhos dos cidadãos, dizendo-lhes que estamos muito melhor na saúde, no ensino, que o nível de vida subiu um pouco. Se em 36 anos de abertura de fronteiras não tivéssemos melhorado nalguns setores, então nada teria valido a pena.
Mas, se há uns dados positivos, quantos se podem indicar com o sinal negativo? Onde está a nossa agricultura, as nossas pescas, a nossa indústria? Somos capazes de concorrer com alguém nesta área? A Europa mandou-nos subsídios para desmantelar tudo isto, e nós, como bons parolos, aceitámos. Hoje, fala-se em exportar – mas o quê?
Somos um país endividado, no público e no privado, por falta de regulação, porque foi permitido transacionar sem valores, sem deve e haver, sem receitas próprias. Enquanto a agiotagem funcionou com total liberdade, porque quem contraía a dívida pública não era e não é responsabilizado, e os privados jogam na insolvência como saída do aperto, as coisas funcionam. Um dia, o agiota resolve cobrar o que lhe devem e não devem, e o caloteiro sente-se asfixiado.
O que se ouve todos os dias por parte de muitos dos que ainda gravitam na área do poder de forma direta ou indireta, é que o próximo Orçamento do Estado tem que ser aprovado, mesmo que estejamos perante um mau orçamento e diretivas que explorem o povo ainda mais, porque temos de mostrar entendimento e união no exterior.
As aparências é que contam, mesmo que tudo cheire mal e esteja podre. Deve mostrar-se aos vizinhos o disfarce de gente séria, sem preconceitos, com o patriotismo levantado, como se os nossos problemas se resolvessem colocando uma máscara na cara e um sorriso de hipócrita. Tem sido esta a prática das últimas décadas, fomentada e incentivada na populaça – mesmo que não possas, compra um carro novo, vai de férias para o Algarve, passeia-te nas Vilamouras e nas Quintas dos Lagos, põe um ar altivo e sobranceiro. Quando voltares a casa, logo devolves o carro, dizendo que tinha um trabalhar esquisito, e as dívidas paga-as aos soluços, mesmo que, dentro de casa, não tenhas pão para comer. Porque as aparências exteriores é que contam.
É isto que os políticos-medíocres, que no futuro, depois de saírem de cena, sabem não ser responsabilizados por nada daquilo que decidiram ou assinaram, continuam a querer alimentar – aparência de que somos aquilo que na verdade não somos.
Post scriptum – Que fique claro que não sou contra os partidos. Sou contra o atual sistema eleitoral, onde os cidadãos não se podem candidatar a deputados sem irem colocados numa lista partidária, e outras regras menos claras que cada um aplica como lhe convém. Quanto ao Orçamento de Estado, penso que não pode ser feito para sacrificar e sugar ainda mais o povo. Se se for necessário diminuir os gastos, então é por aí que começa a boa governação, porque mantê-los é deixar tudo como está, havendo necessidade de mais endividamento para que a dívida possa sobreviver. A despesa é certa, as receitas são imprevisíveis. |